terça-feira, 14 de abril de 2009

Uma prosa para variar.

Ali, naquele bar comum (aquele boteco singelo e bagaceiro que se repete em cada esquina desse país), se encontravam novamente.
Os passantes arregalavam os olhos quando cruzavam pela mesa, mas nada diziam. O preconceito é como uma capa de invisbilidade que cobre as pessoas que a sociedade prefere não ver. E, sob esses olhares invisíveis e onipresentes, lá estavam eles. O grupo que qualquer boa família temeria: a lésbica, a comunista, a revoltada e o travesti.
E não estavam lá, simplesmente. Os desgraçados ainda bebiam e tinham a coragem, imagine só, de conversar em vozes altas. Alguma pessoa mais ingênua diria que até pareciam felizes. Onde já se viu tamanha falta de vergonha? Ser aquilo e ainda sorrir?
As três da madrugada saíram. Cambaleando em seus sapatos (o travesti, inclusive, gingando no salto-alto), entre abraços e brincadeiras. Só que todo mundo sabe que um grupo tão vergonhoso não pode simplesmente sair. Ir e vir é um direito reservado às pessoas normais. Quando um grupo tão socialmente imundo como este sai de um recinto, sua presença continua. As cadeiras ainda em formação na mesa, os copos vazios cobertos com saliva e marcas de dedos. É como se "aquela gente" continuasse ali. Malditos imundos...haviam manchado aquele bar, aquela mesa. Ninguém de bem ousaria sentar mais ali. Isso porque lá não era mais lugar de gente.
Era lugar de fantasmas.